terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Ministros do STF rasgaram a Constituição. Conscientemente.


Ministros do STF rasgaram a Constituição. Conscientemente.



Definitivamente, experiência não é sinônimo de correção. Celso de Mello, o decano do STF, o ministro mais antigo e, portanto, mais experiente da Corte Suprema, foi inconveniente e inconsequente ao afrontar o Poder Legislativo no julgamento de ontem, 17 de dezembro, que culminou com a decretação da cassação de mandato dos parlamentares federais, por maioria de votos, na AP-470.

Não era necessária a dureza do discurso. As consequências podem ser desastrosas. E soou como escárnio sua fala de que o STF reivindicava o "direito de errar por último".

O que a sociedade brasileira espera é um Supremo que não erre e, para isso, basta-lhe seguir à risca o que diz a Constituição, da qual há de ser o fiel guardião, por vocação imposta pela própria Carta Política. E os ministros da mais elevada Corte do país erraram. Conscientemente, permitiram-se errar, porque, não bastasse a clara redação do texto constitucional a respeito, foram alertados pelos quatro bravos dissidentes do voto do relator.

O art. 55, §2º, da CF, estabelece com clareza solar que a perda de mandato de deputado federal ou senador "por condenação criminal em sentença transitada em julgado" (inc. VI) "será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa". Como diziam os latinos, bem ao gosto de Celso de Mello, "in claris cessat interpretatio". Quando a norma é suficientemente clara, dispensa exercício de interpretação.

Mesmo no caso do inc. IV do art. 55 da CF, de perda ou suspensão de direitos políticos (que, no direito penal, tem caráter secundário, porque substitutiva àquela que submete o condenado à pena corporal, privativa de liberdade - vejam-se art. 43, inc. V, e art. 44 do Código Penal), a perda do mandato deve ser declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa. Observe-se que não se prevê provocação por parte do Supremo Tribunal Federal, por qualquer meio, remanescendo condicionada à provocação por algum parlamentar ou partido político, ou por iniciativa (nitidamente não obrigatória) da própria Mesa. E assim é exatamente porque o constituinte de 88 deu à cassação de mandato parlamentar natureza eminentemente política, não jurisdicional.

Em nenhuma das hipóteses, enfim, a cassação é consequência "automática" da decisão judicial nesse sentido, como tem sido alardeado, inclusive pelos próprios ministros do STF, no mínimo porque, em ambos os casos, deve ser garantido ao parlamentar a "ampla defesa", de sorte que decisão nesse sentido só será declarada pela Mesa após o trâmite do devido processo legal interno, no âmbito do próprio Parlamento.

É certo que o STF adotou a regra do art. 92, que prevê como um dos "efeitos" secundários da condenação criminal ("são TAMBÉM efeitos...", esse é o teor do dispositivo) "a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo", mas o Código Penal, como toda lei infraconstitucional, não pode se sobrepor ao que estabelece a Constituição Federal. Tais efeitos "não são automáticos", como expressamente prevê o parágrafo único, mas ainda que declarados pelo magistrado em decisão motivada, impera o comando constitucional, que prevê, no caso específico dos congressistas, que seja dado amplo direito de defesa aos sentenciados.

De mais a mais, às questões eminentemente jurídicas sobrepaira o caráter político da questão, que diz respeito diretamente à essência da democracia, a qual impõe aos Poderes da República mútuo respeito. Só os parlamentares eleitos diretamente pelo povo detêm legitimidade para, em nome de quem lhes outorgou o mandato, pronunciar-se em definitivo sobre a revogação ou não da outorga.

Diante dessa lastimável ocorrência no âmbito da Corte Suprema, impossível não relembrar as sábias e contundentes palavras do saudoso Ulysses Guimarães, proferidas durante a solenidade de promulgação da Constituição que ele próprio chamou de "cidadã": "Traidor da Constituição é traidor da Pátria. Conhecemos o caminho maldito. Rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, para o exílio ou cemitério". E completou: "Temos ódio à ditadura; ódio e nojo!"

domingo, 25 de novembro de 2012

NINGUÉM CHEGA AO STF POR MÉRITOS PRÓPRIOS

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Joaquim Barbosa, já mencionei, é um dos ministros melhor preparados dentre os que hoje compõem o STF. Sua formação jurídica é das mais sólidas e invejáveis e sua trajetória de vida – pessoal e profissional – lhe fornece arcabouço suficiente para enfrentar os desafios que lhe proporciona o ministério supremo. Mas não me venham com essa história de que ele chegou lá “por seus próprios méritos”.

Nem ele, nem o grande Ricardo Lewandowski, nem o decano, nem meus conterrâneos de Capivari, Moacir Amaral dos Santos e Joaquim Salvador de Toledo Pizza e Almeida, nem todos os demais ministros da história do Supremo Tribunal Federal a ele chegaram “por” seus méritos próprios. 

Que todos chegaram “com” méritos, uns mais, outros menos, não tenho a menor dúvida, mas é tolice insistir nessa falsa ideia. Joaquim Barbosa só chegou ao Supremo, sim, por ser negro e por ter sido indicado pelo então presidente Luís Inácio Lula da Silva. Foi, sim, por uma corajosa decisão de Lula, que comprou a ideia de adotar uma “cota para negros” na mais elevada Corte judicial brasileira, que Barbosa obteve a indicação.

Não fosse a disposição política de alastrar a representatividade da comunidade negra por todas as instituições – universidades, serviço público, tribunais –, nascida nas lutas dos próprios negros e que teve guarida no ideário do Partido dos Trabalhadores, Barbosa não estaria lá hoje e, enquanto esse mesmo partido não assumisse a presidência da República, o Supremo não conheceria um afrodescendente em seus quadros tão cedo.

Divirjo da maneira arbitrária e truculenta como Barbosa vem conduzindo os trabalhos como relator do caso AP-470 e temo por sua conduta na presidência da Corte, mas não lhe nego, nem poderia, os méritos que proporcionaram que, dentre tantos outros juristas de todas as raças, tão ou melhor preparados do que ele, o hoje presidente do STF despontasse e motivasse Lula a escolhê-lo para o cargo.

Barbosa presidindo um dos Poderes da República é bem o retrato do novo Brasil, que começou a ser desenhado a partir da elaboração da atual Constituição e que vem ganhando corpo desde a posse de Luís Inácio Lula da Silva na presidência da República - sem demérito de seus predecessores. Este, sim, o menino pobre, filho da miséria real, que mudou a história deste país. Que também só chegou lá não apenas por seus próprios méritos, mas, sobretudo, pela maturidade de seu partido e pela soberana vontade do povo brasileiro.

sábado, 24 de novembro de 2012

AOS 49 DO PRIMEIRO TEMPO

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Estou almoçando num "shopping center" e noto um garoto de uns oito anos de idade parado próximo de minha mesa, olhando para mim. Dirijo meu olhar para ele com ar de “o que foi?” e o menino, envergonhado, sai correndo.

Fico pensando no que o garoto poderia estar pensando ao fixar seu olhar sobre mim. Imagino-o fitando um sujeito gordo e grandalhão, de cabelos ostensivamente grisalhos, comendo feito um porco, com desajeitada voracidade. Ele decerto não sabe, mas tem diante de si um advogado bem sucedido na profissão, embora o saldo bancário insista em dizer o contrário. Um sujeito que arrasta atrás de si uma longa história de vida, exatos quarenta e nove anos completados naquele dia, talvez naquele momento.

Pondero, de mim para mim, como as aparências enganam. Quem me vê não imagina que, na verdade, sou eu um garoto de oito anos de idade. Não o menino desconhecido que me observava há pouco, mas o distante pirralho que fui um dia e que permaneci sendo até hoje e assim hei de permanecer até que me fechem num esquife – ao final não do segundo tempo, mas de longa prorrogação.

Concluo, de inopino, que os adultos, as pessoas maduras, os velhos, não passam de crianças crescidas. Passamos a vida acumulando conhecimento, experimentando emoções, lidando com alegrias e frustrações, aprimorando ideias, mas mantemos a mesma puerilidade com que percebíamos a vida à nossa volta na infância. As primeiras percepções são as que ficam. Os mesmos pudores, as mesmas chateações, as mesmas birras. Magoamos e nos magoamos com a mesma facilidade com que perturbávamos e éramos perturbados pelos amiguinhos e coleguinhas dos primeiros anos de existência – e estávamos a décadas de conhecer a palavra "bullying" ou o conceito de assédio moral.

Quem me vê deve me imaginar um sujeito cheio das certezas, aferrado às próprias convicções, o dono da verdade, dela mesma, da Verdade verdadeira. Não adianta sorrir, expressar simpatia, ter a humildade para ouvir e aprender, há sempre quem me veja como homem feito, seguro como um edifício construído sobre firme alicerce. 

Qual nada. Ainda trago no espírito os mesmos temores e as mesmas inseguranças que tinha aos oito anos de idade. Ainda nutro um medo danado de cair na rua e desabar num choro doido e doído, daqueles em que tudo o que se quer é o socorro e os cuidados da mãe – que, no meu caso, já nem mais está entre nós. 

Dia desses, ao entrar num restaurante, tropecei no tapete da entrada e mergulhei sobre a primeira mesa que encontrei pela frente. Não desandei a chorar, como temia, só senti dor no tornozelo, mas os dois sujeitos que me acudiram tiveram o zelo de despertar em mim, pelo menos, o sentimento da vergonha. “Fique tranquilo, não ligue porque as pessoas estão olhando”, aconselhou-me um deles. Foi só então que enrubesci envergonhado e segui meu caminho sem conseguir olhar para as demais pessoas que estavam ali, embora tenha sido possível perceber que nenhum outro freguês notara o ocorrido. Apesar disso, ainda não tive coragem de retornar ao restaurante.

Agora estou aqui, no "shopping", pensando nos meus quarenta e nove anos completados agora há pouco, comendo, que é para não perder o costume. Termino, dou uma passada no banheiro e me deparo com minha enorme figura refletida nos grandes espelhos do lugar. Como diria Roberto, “o tempo parou para eu olhar para aquela barriga...” De novo, senti vergonha. Saí dali correndo, como criança fugindo de algum fantasma. 

Onde raios está aquele menino de oito anos de idade?


segunda-feira, 12 de novembro de 2012

MINHA SOLIDARIEDADE A JOSÉ DIRCEU


Esta foto foi tirada em 1992. Eu era candidato a prefeito de Capivari. Quando me apresentei, ele comentou "Capivari, terra de Almir Pazzianotto", demonstrando carinho pela cidade e pelo ilustre conterrâneo, ex-ministro do Trabalho. Em seguida, me disse: "tomara que você vença".

Hoje, vinte anos depois, os ministros do STF condenaram José Dirceu a mais de dez anos de prisão por um crime cuja existência desafia a lógica, que não existiu e, p
ior, sem que tenha havido qualquer prova de sua participação nesse não-crime.

Em primeiro lugar, a acusação de "corrupção ativa" é pura bobagem jurídica, no caso do ex-ministro. Uma estúpida tentativa de criminalizar a atividade política. O ministro da Casa Civil é uma pessoa que tem o dever de representar o governo federal nas negociações com os membros do Congresso Nacional. Age, portanto, em nome do governo. Não é um "particular", condição essencial para que ocorra o crime de "corrupção ativa". Está lá, no Código Penal, encimando o capítulo II, onde se insere o art. 333: "dos crimes praticados pelos PARTICULARES contra a administração em geral". Trata-se de crime que, por sua própria natureza, não pode ser cometido por agente público, a não ser que em busca de uma vantagem pessoal, de natureza particular; jamais em nome da própria administração!

Em segundo, em relação ao crime de formação de quadrilha, ainda que se aplique a teoria do "domínio do fato", exige-se, para tanto, prova de atos que o acusado tivesse praticado, nessa condição. E não sou eu que estou dizendo: é o próprio jurista alemão Claus Roxin, que desenvolveu essa teoria.

Por derradeiro, a absoluta ausência de lógica na ideia sacramentada pelo Supremo de que um partido político - que, como todo partido político, tem por vocação necessária exercer o poder - tivesse um plano de se perpetuar no comando do governo comprando "a consciência" de meia dúzia de deputados (e não de senadores) para aprovar medidas impopulares, como, por exemplo, a reforma da Previdência! Uma reforma que, num primeiro olhar, "prejudicou" uma legião de brasileiros que se encontravam na iminência de se aposentar e que tiveram que aguardar por mais tempo. Ou por uma reforma tributária que até hoje não ocorreu!

É inacreditável a poltronice da imensa maioria dos membros do Supremo Tribunal Federal, que seguem as diatribes do relator sem se dar conta da gravidade do mal que estão praticando. Estão gerando em todo o país uma incontrolável insegurança jurídica, eis que doravante ninguém mais será levado a sério quando invocar princípios que à custa de muita luta foram consagrados na Constituição brasileira, como o da presunção de inocência, que exige prova cabal para se condenar alguém pelo crime de que é acusado.

Eu não tenho a menor dúvida de que esse é um julgamento de exceção e que não tardará a ser revisto, quando a volúpia da imprensa conservadora for mitigada pelo tempo, seja em breve, no julgamento dos embargos declaratórios (que, em certos casos, podem alterar o resultado, adquirindo caráter infringente), ou mais adiante, nos próprios embargos infringentes, ou ainda numa futura ação revisional, tão logo ocorra o trânsito em julgado.

A despeito dessa confiança, reitero minha exortação para que os grandes nomes da advocacia nacional não se calem, mas que não apenas falem; que emprestem seu peso para reverter, num portentoso processo conjunto de "habeas corpus" em favor dos réus, por exemplo, essa decisão que faz ruir os alicerces que haveriam de sustentar a segurança jurídica de todos nós brasileiros.

Força, comandante! Você sempre foi valente e sempre esteve ao lado da justiça e dos valores que erigiram o nosso estado democrático de direito. Mais que minha solidariedade, aceite, modestamente, o meu empenho.

Grande abraço!

terça-feira, 30 de outubro de 2012

O PECAMINOSO “PROJETO DE PODER” DA COMPANHEIRADA

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Tá, então tá combinado. O PT, partido ao qual pertenço desde minha mocidade, é uma quadrilha que tem – e deve ter tido desde sempre – um odioso “projeto de poder”, segundo as contundentes e sábias palavras do ministro presidente do Supremo Tribunal Federal, ex-companheiro Ayres Brito (que outrora fora candidato a deputado federal pela mesma sigla quadrilheira, mas isso, claro, bem antes de mergulhar para debaixo da toga ilustre). Eu me pergunto para que servem os partidos se não tiverem um “projeto de poder”, mas fica combinado que isso é feio, é pecado, é uma imoralidade, um ilícito que corrói as instituições e degrada os bons e honestos princípios que orientam a política no Brasil desde a eternidade. 

Bem. Essa quadrilha, ansiosa para por em prática seu ignominioso “projeto de poder”, eis que não se pejou de assacar os cofres públicos para, com recursos deles extraídos, comprar a consciência de deputados federais. Quantos deputados? Meia dúzia, uma dúzia, algo em torno disso. E somente deputados, já que os senadores são um colegiado de vestais da mais impoluta estirpe com os quais não vale a pena entabular negociações escusas.

Sigamos. Por esse “projeto de poder”, que alguns leem como “plano de perpetuação no comando da Nação”, os pobres e inocentes deputados cujas consciências foram arrematadas pela vil quadrilha haveriam de aprovar projetos seguindo as orientações do governo. A confiar nas palavras do eminente ministro relator Joaquim Barbosa, do decano Celso de Mello, do polêmico Marco Aurélio – este, membro da honrada família Collor de Mello –, essa meia dúzia ou dúzia e meia de parlamentares deveria aprovar reformas, como a da Previdência, a tributária... 

Mas, peraí. Como todos sabemos, as reformas são apresentadas em formato de PEC, ou seja, de propostas de emenda à Constituição. Que, para serem aprovadas, precisam do voto favorável de três quintos dos membros de cada Casa do Congresso Nacional (é o que está na Constituição; quem quiser conferir, veja lá no art. 60, §2º; pode bem ser que eu esteja enganado). Em dois turnos, reparem. 

Agora, computemos. Três quintos. Do Senado e da Câmara Federal. São 81 senadores e 513 deputados federais, o que exigiria 49 votos no Senado e outros 308 na Câmara. Mas o meu bando maligno, que, além de desonesto, decerto é também incapaz de fazer singelos cálculos aritméticos, acreditou que aquela meia dúzia, ou dúzia e meia, de deputados comprados daria conta de aprovar as PEC’s. E – alvíssaras! – eles conseguiram! Aprovaram!!! Os números se entrechocam na minha mente como elétrons no interior do átomo, mas deve ser essa maldita enxaqueca...

Pois bem. A vantajosa arrematação efetuada no leilão das consciências pela quadrilha a que pertenço era para aprovar a reforma da Previdência, dentre outras. Concentremo-nos nela, ora, pois pois. Que raios, afinal, era essa tal reforma? Por acaso, não foi a que atrasou a aposentadoria de muita gente, muitos brasileiros, que estavam na iminência de pendurar as chuteiras e que, por isso mesmo, ficaram muito irritados com o governo, naquela ocasião? 

Ah! E tem a reforma tributária, dita e repetida diversas vezes pelos ministros do Supremo. Mas não é justamente essa a reforma "que não sai", por contar com forte oposição de prefeitos e governadores, segundo dizem os analistas políticos e econômicos? Poxa, saiu e nem percebemos...

Ora, então estou começando a entender. Ou a desentender, sei lá. O PT comprou deputados para aprovarem uma reforma previdenciária que, assim, num olhar superficial, bem ao gosto do senso comum, seria prejudicial a uma grande parcela de brasileiros? E esses meus comparsas da criminalidade queriam, com medidas impopulares dessa envergadura, perpetuar-se no poder? Genial! 

Será possível que José Dirceu e José Genoíno, para ficar apenas nos postos mais elevados do comando da organização criminosa - eles detinham o "domínio dos fatos", lembra-nos o supremo decano Celso de Mello -, súbito viram-se tomados pelos espíritos dos aloprados, aqueles a que assim se referiu Lula num passado ainda bem presente?

Se, pelo menos, os agentes da malsinada quadrilha tivessem tentado aprovar uma emenda à Constituição que permitisse, por exemplo, um terceiro mandato para Lula, faria sentido. Mas não, essa coisa de reeleição para favorecer o presidente da hora só é permitida a bandos de aves mais puras, é bem de ver.

Ah! Tem mais. Esse abilolado bando de insaciáveis assaltantes dos cofres públicos do qual faço parte - só estou reprisando a ênfase do decano -, apesar de comprar a peso de ouro meia dúzia, ou dúzia e meia, de deputados para votar medidas impopulares que, mesmo incomodando os brasileiros, haveriam de garantir sua perpetuação no poder, amargava derrotas em votações importantes. Mesmo assim, continuava irrigando e abastecendo o supermercado das consciências! Negocião da China esse, né não?

Tá, então tá. Se os excelsos ministros da Suprema Corte, homens de conduta ilibada e notório saber jurídico – e, quiçá, matemático também –, acreditaram nisso tudo, quem sou eu para duvidar, né mess? Eu também acredito, juro!

Ô se acredito... Eu mais a velhinha de Taubaté. 

(Luís Antônio Albiero, advogado, assessor jurídico parlamentar, ex-vereador de Capivari, SP, pelo PT, de 1989 a 1992 e de 2001 a 2004).

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

A VERDADE ENCARDIDA

A comunidade jurídica brasileira não pode compactuar com o que está acontecendo no Brasil, no âmbito do STF. Juristas que têm nome e história a zelar precisam se manifestar, com urgência, e se manifestar de modo eficaz, não apenas emitindo opiniões. 

Sugiro um habeas corpus em favor de José Dirceu e José Genoíno - que estão sendo e serão condenados sem prova -, assinado por d
iversos grandes nomes da advocacia e dos meios acadêmicos.

No caso de Dirceu, é absurda a acusação de "corrupção ativa", cujo tipo penal está capitulado entre os "crimes praticados POR PARTICULAR CONTRA a administração em geral". Ora, Dirceu era ministro e, no exercício de suas funções, atuava como servidor público, em nome da administração pública; não era "particular" e não agia em favor de um "interesse pessoal".

Já é um absurdo imaginar que um governo ou um determinado governante queira "corromper" parlamentares para que estes votem em favor de políticas públicas. Não há, evidentemente, qualquer "vantagem" pessoal do administrador nessa conquista. E, de mais a mais, reconhecer um suposto esquema de "compra de votos", para esse fim público, é reconhecer a nulidade das votações levadas a efeito. Fosse mesmo verdadeiro esse fato, as reformas da Previdência, tributária e outras haveriam de ser declaradas nulas!

De resto, que "vantagem" pessoal teria Lula, ou José Dirceu, ou Berzoini ou outro ministro com a aprovação desta ou daquela reforma constitucional? A "vantagem" integra o tipo penal da corrupção ativa. Estranha essa imagem de um "estado corruptor", algo inédito, penso eu.

O esforço com que o relator Joaquim Barbosa, acompanhado por outros ministros, vem fazendo para torcer a verdade torrencialmente demonstrada nos autos me faz dar razão ao presidente do STF, Carlos Ayres Brito: "quanto mais se torce a verdade, mais ela se encarde".

Que não seja o Supremo Tribunal Federal o "encardidor geral" da República!

terça-feira, 19 de junho de 2012

E POR FALAR EM COERÊNCIA...


Amigos, companheiros, leitores ocasionais. Estou "ficando louco" de tanto trabalhar, e olha que estamos apenas nos preparativos para a campanha eleitoral. Muito mais trabalho se avizinha... Por conta disso, dei uma "sumida" do Face, mas tenho sido informado dos acontecimentos por minha esposa,Luciana Falcirolli Albiero.

E, pelo que ela me conta, tenho me fartado de rir com as críticas ao apoio que o PP, por intermédio de seu principal líder, o ex-governador Paulo Maluf, anunciou em favor da candidatura de Fernando Haddad, do PT, a prefeito de São Paulo.

E tenho me fartado de rir por constatar o quanto a velha elite - parte dela; não vou mais cometer o pecado da generalização - é "coerente" na vanguarda dessas críticas ao acordo. Até outro dia, essa gente votava - grande parte dela, pelo menos - em Paulo Maluf, com a mesma cegueira com que ainda hoje odeia Lula.

Agora, que o "brimo" capitulou ao modo petista de governar, que veio ao encontro do PT para, mais que anunciar apoio ao candidato petista, demonstrar reconhecimento aos acertos das políticas públicas adotadas pelos governos de Lula e de Dilma, essa mesma elite dá-lhe as costas. Sim, porque é disso que se trata: o gesto do velho cacique paulista tem esse sentido, de reconhecer que o Brasil deu certo sob o governo do PT e que é possível repetir esse sucesso também em São Paulo. E esse reconhecimento não cai bem à soberba da Casa Grande.

Já Erundina está certa. Não se sentiu confortável, repeliu o apoio malufista, desistiu da candidatura a vice. Mas foi enfática ao informar que mantém "apreço" a Haddad, que continua na sua campanha e pronta para executar as tarefas "que o PT" lhe confiar. Ótimo. De novo, digna do meu aplauso.

Também não tenho como "defender" essa estranha aliança entre PT e Paulo Maluf; é algo intragável para um petista como eu. Mas é preciso reconhecer que a aliança não se restringe à figura do ex-governador, tampouco ao eleitorado que ainda se mantém fiel a ele, mas alcança um partido importante, que ainda tem peso no cenário político, sobretudo entre os conservadores - parte da elite a que me refiro -, com os quais os petistas têm dificuldade de dialogar.

De mais a mais, Lula não foi à casa de Paulo Maluf pedir apoio. Foi receber. O hoje deputado federal, de triste memória por suas desastrosas passagens pelo governo do Estado e pela prefeitura de São Paulo, foi quem se dispôs a apoiar a candidatura de Haddad. E apoio, definitivamente, não se dispensa, a menos que não se queira vencer uma eleição.




O episódio é apenas uma turbulência passageira durante um voo longo e decisivo para o PT. Será absorvido e diluído no tempo, como já foi quando o mesmo Paulo Maluf e seu partido, embora de maneira mais discreta, apoiaram a reeleição de Marta Suplicy para prefeita de São Paulo. Como foram os apoios de Collor, Sarney e outros a Lula e Dilma.

Enfim, isso tudo passa, sem deixar qualquer sequela significativa. O graúdo do eleitorado está alheio a essas questiúnculas políticas e a esses pruridos ideológicos. O que importa mesmo é que o voo chegue ao destino, e na mais absoluta segurança.


Eu precisava dar esse alozinho. Agora, volto ao trabalho que tenho muito que fazer. Abraços a todos.




sábado, 9 de junho de 2012

O INCÊNDIO

Cá com os meus botões, fico a pensar se quando Hitler insuflou o povo alemão contra os judeus ele, de fato, instigou o ódio ou apenas aproveitou-se de um sentimento generalizado que já permeava seu povo. Viviam-se tempos de desemprego e recessão e a sensação era de que os judeus tomavam empregos e se apropriavam de riquezas dos alemães. 

Em tempos de vacas magras, e diante da incapacidade governamental de dar conta das demandas - mormente de ordem econômica -, apela-se para o sentimento de patriotismo. Afinal, o culpado é sempre o outro, o diferente. 

Quando os nativos começam a se preocupar com os estrangeiros, com os de outra raça ou região, por medo de que estes lhes tirem os empregos e dividam suas riquezas, é sinal evidente de que está se formando, ou já está formado, um caldo de cultura propício ao surgimento de um líder político que possa vir a fazer uso dessa matéria-prima para arroubos nazi-fascistas. 

O Brasil vive momentos de pleno respeito às instituições democráticas, a despeito de vãs tentativas maldosas de alguns de mostrar o contrário. Depois que os membros do Congresso, regiamente remunerados pelo governante de plantão - falo de tempos idos, passagem desbotada da memória -, garantiram a este um novo mandato, por meio da emenda constitucional que lhe proporcionou a possibilidade da reeleição, não se teve notícia séria de outro rompimento institucional grave.

Logo depois desse triste episódio, falou-se tanto do risco, só existente na mente dos que foram apeados do poder e de seus seguidores, de que Lula, alçado à presidência da República, instalaria o caos no Brasil. Muitos não resistiram à tentação de associá-lo a figuras históricas nefastas, como Hitler e Mussolini. Quebraram a cara, mas ainda hoje não dão o braço a torcer. Onda vai, onda vem, lá vêm eles com a lengalenga. O ex-presidente, porém, foi o que mais respeito dedicou às instituições.

Respeitou o Ministério Público Federal quando aceitou a indicação feita pelos procuradores da República, e manteve a nomeação de Antonio Fernando de Souza, reconduzindo-o ao cargo de Procurador-Geral. E olha que ele havia sido o autor da denúncia do tal "mensalão"! Depois, repetiu a conduta em relação a outro nome surgido por indicação do conjunto de procuradores, Roberto Gurgel. E em relação a este, o tempo incumbiu-se de mostrar-lhe a verdadeira cara. Só para comparar, o governador Geraldo Alckmin, por exemplo, não teve coragem de seguir o exemplo de Lula e nomeou para Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo quem bem quis, ignorando o preferido de promotores e procuradores, escolhido em democrático processo eletivo interno.

Muito se disse, também, acerca de um desejo oculto de Lula calar a imprensa. Veja, Folha, Estadão, TV Globo e outros da chamada mídia velha - a que denomino "carcomídia" - não perderam um dia sequer a oportunidade de atacar o governo petista, a própria figura do presidente, por razões às vezes justas, injustas na maioria. E o que fez o ex-presidente? Nos momentos mais críticos, fez discursos, apenas. Quantos processos moveu contra os órgãos de imprensa? Nenhum! E olha que não lhe faltou material. Quantas vezes deu ordens às estatais para que cortassem a destinação de verba publicitária para esses veículos? Nenhuma!

Também a título de comparação, Gilmar Mendes, valendo-se do prestígio de ministro do STF, não perdeu tempo ao ver-se criticado por blogues independentes. Foi ao presidente da Caixa Econômica Federal e "solicitou" a ele que parasse de - como disse - "financiar esses blogues que atacam as instituições". Por "instituição", leia-se ele próprio, Gilmar Mendes, já experimentado em fazer pressões do gênero, como a que fez sobre o mesmo ex-presidente Lula para que este demitisse o delegado que comandava a Polícia Federal e a ABIN, Paulo Lacerda. 

No plano interno, à parte ter sucumbido à pressão do então presidente do STF, Lula proporcionou melhores condições à Polícia Federal, que desencadeou centenas de ações que levaram à prisão "gente graúda" - governadores, desembargadores, juízes, prefeitos, empresários - e fez a Controladoria Geral da União funcionar. Criticou, é verdade, o Tribunal de Contas da União, e com razão, já que este enveredou por um ativismo político inaceitável. Mas respeitou plenamente suas decisões.

Lula também não se deixou encantar pelo canto de sereia dos que lhe anteviam a possibilidade de um terceiro mandato. O ex-presidente tinha tudo para isso, aceitação popular e maioria no Congresso, mas manteve-se firme no respeito às regras vigentes.

Enfim, não foi Lula o "novo anticristo" que muitos alardearam. Mas é fato que, ao menos por estas bandas paulistas, há um preconceito permeando os nativos, que se verifica na preocupação que muitos nutrem em relação aos nordestinos, por exemplo. O caso Maiara Petruso, condenada recentemente por ter promovido uma sórdida campanha pelo Twitter logo depois das eleições presidenciais, é significativo. Em mensagens claras, sem meias palavras, ela pregava a "morte aos nordestinos", associando-os a "vagabundos", usurpadores das "nossas riquezas".

Esse sentimento em relação aos nordestinos continua presente nas redes sociais, na forma de piadas de péssimo gosto, que muitos ingênua ou maldosamente repetem, passam adiante, curtem e festejam. Aos ingênuos e aos maldosos falta respeito, amor ao próximo, tolerância às diferenças. 

É verdade que vivemos um momento econômico excelente, comparado ao resto do mundo, graças sobretudo às medidas certeiras adotadas pelo próprio Lula e por sua sucessora, em meio a uma forte crise internacional. Mas é certo que o caldo de cultura está pronto, disseminado, espalhado feito combustível, à espera de um líder destrambelhado que queira riscar o fósforo.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

A IDOLATRIA E A "ODIOLATRIA"


Uma das acusações mais frequentes que se fazem a nós, petistas, é a de que seríamos "idólatras", ou seja, que cultuaríamos a figura de  Lula como se fosse um "deus".


Nada mais inverídico e injusto. E estúpido. Lula tem uma importância que transcende as fronteiras do partido. É respeitado pelos simpatizantes e filiados ao PT e, provavelmente, muito mais fora dele, no interior do amorfo conjunto das pessoas que, por ingenuidade ou opção, manifestam desprezo à política e aos partidos. Sem contar o incontável número de admiradores pelo mundo afora.


Todo conjunto de pessoas - de uma singela associação de bairro aos maiores conglomerados empresariais multinacionais - tem uma ou algumas figuras que se destacam. Lula destacou-se no PT antes mesmo de o partido existir. O PT nasceu da sua cabeça, de um projeto ousado de construção de um partido de massa, que tivesse por prioridade absoluta representar a classe trabalhadora. Que esse homem tenha-se tornado líder dessa sigla, portanto, nada mais natural. Que no âmbito desse partido seja respeitado e admirado, idem. Que, alçado à presidência da República e tendo obtido e proporcionado todas as conquistas havidas, ib idem. Portanto, é perda de tempo e desperdício de massa encefálica acusar os petistas ou os brasileiros em geral de "endeusar", "idolatrar", seu líder político maior da atualidade.


Para nós, petistas, é um orgulho imenso ter como figura máxima do partido uma pessoa como Lula. Por sua trajetória, por seu dinamismo, por seu vigor, por seu elevado grau de consciência política, por sua inteligência ímpar, por sua capacidade de liderar e competência para governar, por sua perene expressão de alegria e celebração da vida. Para os brasileiros em geral, o orgulho há de ser ainda maior - exceto para uma pequena parcela que, na contramão, nutre por ele extremo ódio. Que há os que se excedem na admiração, alcançando até mesmo o ponto de cegueira, também não tenho dúvida, mas toda generalização é perniciosa.


Poucos, enfim - se é que existem -, podem dizer-se indiferentes a Lula. Ou se ama, ou se odeia o metalúrgico que governou um dos maiores países do mundo e o tornou um dos mais importantes.


O que me parece digno de um exame aprofundado é o oposto, a idolatria negativa, a "odiolatria" - se me permitem o neologismo -, o elevado grau de ódio que parcela ínfima dos brasileiros nutre por esse homem. Não vou mencionar o preconceito, porque, de tão usado, tornou-se por demais surrado. Já não convence. Eu diria mesmo que se estabeleceu uma espécie de preconceito em relação à palavra "preconceito"...


Em verdade, ódio não se explica. É apenas sentimento, no sentido de ser pura manifestação maligna do espírito de quem odeia. Pode-se odiar Lula por falar errado, por ter a voz rouca ou a língua presa, por ser nordestino, por ter tido uma origem humilde, por não ter cursado faculdade, por ter feito um governo voltado aos mais necessitados, aos negros, aos índios, às mulheres. Pode-se odiar Lula por qualquer reação química do próprio cérebro de quem o odeia. Pode-se odiá-lo por ser petista... 


O fato é que, se é condenável a idolatria, naquele sentido de se nutrir uma admiração por alguém até o limite da cegueira, da incapacidade de enxergar-lhe os defeitos, é igualmente condenável o ódio. Tanto quanto a paixão exacerbada, o ódio também cega, também turva a mente, igualmente compromete a capacidade de enxergar e discernir.


Tome-se por exemplo o recente episódio protagonizado pelo ministro do STF Gilmar Mendes, que, mais de um mês depois do ocorrido, foi à revista Veja e disse que teria sido "pressionado" pelo ex-presidente Lula para adiar o julgamento do mensalão. A revista publicou a notícia e, menos de 24 horas depois, o fato foi desmentido por uma terceira pessoa, única testemunha presencial da reunião. 


Foi um encontro a três. Um diz que houve pressão, o outro diz que não. Até aqui, palavra contra palavra - que, no âmbito judicial, resolve-se ouvindo as testemunhas. O terceiro personagem, testemunha única, enfaticamente, disse que não houve pressão, que sequer se tocou no assunto mensalão. Esse terceiro, o ex-ministro do STF Nélson Jobim, é amigo pessoal de Gilmar Mendes, vinha escrevendo um livro em conjunto com ele. Além disso, foi ministro do governo de Fernando Henrique Cardoso, ou seja, de partido opositor ao de Lula. Alguém, enfim, absolutamente insuspeito para negar a versão do próprio amigo e ex-colega. De que adiantou? Para a mídia velha brasileira, quase nada. Para os "odiólatras" de Lula, absolutamente nada. 


O que dizer desses, a começar da mídia, alcançando as pessoas importantes e as comuns que se manifestaram pelas redes sociais, que, a despeito do qualificado testemunho de Nélson Jobim, apesar da palavra de um ex-presidente da República, apesar, sobretudo, do fato de o próprio Gilmar Mendes ter relativizado o episódio - deixou de mencionar a "pressão" e passou a dizer que houve mera "insinuação" e que apenas, pobrezinho, "se sentiu" pressionado -, ainda insistem em dar crédito absoluto à versão original, disseminada pela revista Veja? Seriam desonestas essas pessoas? Talvez, mas não creio. 


Não vejo outra explicação a não ser o ódio. Que, como disse, cega, compromete o discernimento, impede a capacidade de raciocinar.