quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

Capivari: entre a senzala e a modernidade

O blog do filósofo e professor Roberto Romano (Unicamp) trouxe uma postagem, no dia 14 de dezembro deste ano, em que Geraldo Hoffmann (da DW World) faz um relato sobre a exploração da mão-de-obra nos canaviais de minha cidade, Capivari.

Roberto Romano
Roberto Romano

Com o interessante título "Tecnologia de ponta convive com 'senzala' nos canaviais", Hoffmann revela o contraste que marca o novo ciclo da cana vivenciado pelo Brasil, em que uma tecnologia de ponta convive com arcaicas e desumanas condições de trabalho. Entre outros dados, ele informa que no ano passado doze cortadores de cana morreram no Estado de São Paulo – supostamente por cansaço.

Em 2006, o Ministério Público do Trabalho (MPT) da 15ª Região e o Ministério Público do Estado (MTE) de São Paulo fiscalizaram 140 empresas no interior paulista e registraram mais de 600 autos de infração em lavouras de cana-de-açúcar. "Todas as empresas fiscalizadas apresentaram irregularidades", informaram as autoridades. As infrações mais freqüentes foram a falta de equipamentos de proteção individual, excesso de jornada, não fornecimento de água fresca e potável, falta de sanitários e abrigo para refeições, ausência de exame médico admissional; ausência de pausa para refeições e descanso intrajornada; transporte irregular; e alojamentos precários.

Cortador de cana em Capivari
Corte manual de cana: só onde as máquinas não chegam

Só não entendo por que o autor afirmou que a usina por ele visitada "pode ser uma exceção" a essa realidade. Quem, como eu, advoga ou advogou em favor de cortadores de cana de Capivari e região sabe exatamente do que se trata. Como vereador, em 2001 fiz uma representação ao Ministério Público do Trabalho tratando do assunto, apontando para a prática de crimes como a de promover trabalho análogo à condição de escravo (art. 149 do Código Penal) e aliciamento de trabalhadores (art. 207).

Digo-vos, amados leitores, que não precisais ser juristas para entender o que diz a lei a respeito. Vede adiante o teor do art. 149 do Código Penal:



Redução a condição análoga à de escravo

Art. 149 - Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

Parágrafo primeiro - Nas mesmas penas incorre quem:

I - cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;

II - mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

Parágrafo segundo - A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido:

I - contra criança ou adolescente;

II - por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.


Agora vede o teor do art. 207 do Código Penal:




Aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional

Art. 207 - Aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional:

Pena - detenção de (1) um a (3) três anos, e multa.

Parágrafo primeiro - Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao local de origem.

Parágrafo segundo - A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental.

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